“Aquele a quem a palavra não educar, também o pau não educará” (Sócrates)

Me revolta muito certas coisas que não posso mudar e que vejo absurdamente erradas. Uma delas é presenciar mães humilhando ou batendo em crianças na rua. Bater já é uma humilhação. 

Pagava minha compra em um mercado, quando de dentro vi e ouvi uma mãe  que passava pela calçada, xingando em bom tom com uma menininha. A aparência da criança era de 5 anos. Na hora já começando a ficar indignada, pois além de xingar ela também dava “tapinhas”. Comentei por ali. E quem deu importância? Apesar de uma moça ter me olhado quando falei, ela não se manifestou. Bom, vou acreditar que não entenderam e que não viram nada.                                                                                                                                                                        

Saí de la acompanhando de propósito a mãe que continuava a esbravejar com a  menina e a dar tapas em seu ombro. Parecia que a pequena procedeu errado na escola e ela a “repreendia” por isso. Como falava alto, pude entender algo.
– Já havia te falado que ia te bater. Por que você fez isso? Por quê? Vai fazer isso com a professora de novo?
E assim foi a mãe atravessando a rua, xingando, empurrando, e dando tapinhas na menina. Só de relatar me sinto triste.
Essa mãe ainda estava com outras crianças. Uma talvez um ano a mais do que a  primeira e um bebê de colo.
Com o coração na mão, vontade de chorar e ainda segurando sacolas pesadas, fiquei na calçada observando aquele ato covarde. Dor maior foi ver a menininha sentada na calçada respirando com soluços e choramingando.E a mãe só repreendendo… Deu vontade levá-la pra casa .Elas esperavam o ônibus.
Me veio o ímpeto de atravessar a rua e pedir para parar. E quase fiz isso. Mas com quem eu estaria lidando?
Também, o mínimo que ouviria era que a filha não era minha e pra eu não me meter. E como disse meu marido, era sujeito ainda a menina apanhar mais por isso.
Percebi que algumas pessoas que estavam perto deles também no ponto, me viram olhando indignada. As mesmas pessoas que viam aquele absurdo e não falavam nada. Se eu estivesse perto não conseguiria me segurar….
Virei as costas e fui com o coração partido pra casa. Querendo gritar pro mundo a minha dor ao ver tal absurdo. Tal falta de amor. Tal ignorância.
É por isso que esse mundo está desse jeito. Porque ninguém mais olha o ser humano como tal. Ninguém olha para os membros da família com a importância que tem. Ninguém vê mais ninguém como pai, mãe, filho, irmão, com o devido respeito e amor.
Fiquei sufocada ao pensar que em casa a “correção” seria maior. Mais humilhação e mais “tapinhas”. Já que ninguém estaria vendo. Tapinhas não doem, não marcam não é mesmo? 

Doem sim. Doe a humilhação de passar por isso. Doe ver as pessoas que mais amamos em nossa frente nos enfrentando com as mãos que serviram pra amamentar ou acariciar um dia, mas que perderam o sentido verdadeiro delas. 
E assim vão as pessoas “corrigindo e educando” os filhos. 


– Ah, dou só um, dois, três, tapinhas no meu filho, na mão, na cabeça, na boca e ele  fica bonzinho. Tapinha de nada.
Mas só isso. 

Claro. Quem não ficaria bonzinho dessa forma? Quem não teria medo de monstros enormes na frente e pararia de fazer a pirraça ou coisa errada por temor a esses monstros? Sim. Porque somos monstros enormes na frente das crianças. Por isso psicólogos e outros especialistas nos ensinam a abaixar para falar com a criança, ou seja, ficar do seu tamanho para educar, conversar, acarinhar.

Queria ver esses mesmos monstros levando tapinhas e sofrendo humilhações cada vez que fizessem algo errado. 

Não importa se é um tapinha ou dois. Crianças são indefesas. E sabemos disso. É fácil bater em alguém indefeso, já que não vão revidar. E assim derramamos neles nossa raiva. 
Não existe correção física com tranquilidade. Ninguém deixa pra “educar” o filho com uma surra ou tapinhas no outro dia quando tudo passou. Ninguém vai avisá-lo com toda calma do mundo que ele vai apanhar porque fez algo errado. 
E assim não educamos, mas extravasamos nossos sentimentos de impaciência e intolerância ao levantar nossas mãos aos nossos filhos.
Tudo é paliativo. Porque não se consegue impor respeito dessa forma e sim medo. É fácil obedecer assim e mais fácil ainda “educar” assim.. Diálogo dá trabalho. Conversas dia-a-dia são cansativas. Afinal, pra que todo esse esforço se posso dar um tapinha e tudo resolve? Resolve sim, na hora.

Mas eu pergunto: Que marcas você quer deixar na vida do seu fiho? 
De amor, de compreensão, de ensinamentos, de paciência ou marcas de humilhações, de dor, de intolerância, de desamor?

Violência gera violência, e a criança entende que se os tapas “resolvem” a situação, se os tapas são para corrigir alguma coisa, ela também vai querer “corrigir” o irmão, o coleguinha, o primo, o seu animal de estimação. É por isso também que tanto filho bate nos pais. Assim ele aprendeu. Como cobrar o contrário?
Embora esse assunto gere discussões, não foi minha intenção. Nem tão cedo iria escrever sobre isso.
Foi apenas um desabafo. Um desabafo pelo sentimento de impotência que fiquei. Um desabafo pela revolta e angústia na hora. Um desabafo por ter a certeza que em casa seria tudo pior.
E mais do que um desabafo uma prece. Uma prece a essa menininha que nem sei o nome. Um pensamento à sua fragilidade e inocência. Uma prece a essa mãe para que um dia mude suas atitudes e que com urgência eduque a ela mesma para que possa educar com amor e dignidade seus filhos. Amém!
 “Quando você levantar o braço para bater em seu filho,
 ainda com o braço no ar, pense se não seria mais educativo 
se você descesse esse braço de forma a acariciá-lo, em vez de machucá-lo.”

(Khalil Gibran)